sexta-feira, 21 de maio de 2010

Mais "Koans"...




Numa pequena cidadela ao pé de uma alta e gelada montanha, um candidato a discípulo recebeu a incumbência de meditar no pico da mesma para testar a sua resistência e concentração.
Nos primeiros 500 metros a temperatura era até favorável, pois no verão ficava por volta dos 28 graus,o que resultou em suores e cansaço, pelo esforço incial, além do seu manto se enroscar em arbustos na subida. Depois ficou mais amena, até atingir os 2100 metros, quando avistou uma choupana, onde vivia um velho, magérrimo e desdentado, cercado de "yaquis" (boi típico do Himalaia). O ancião lhe disse que se alimentava somente do leite dos "yaquis", já que não tinha dentes nem alimentos, por perto. Propôs trocar um "yaqui" pelo manto do pretendente a discípulo, que, a princípio, relutou em se despir e ficar vulnerável à intempéries, apenas com sua precária roupa de baixo que lhe cobria as "vergonhas", mas decidiu garantir um alimento importante em sua empreitada, pois nada encontraria no cume da montanha para sobreviver convenientemente. E lá se foi o candidato a monge, rebocando o seu "yaqui" com estranhos pensamentos na cabeça, por inveja da espêssa pelagem do animal que o protegia contra o frio que aumentava a cada 100 metros adiante, até que viu que o seu fornecedor de alimento se recusava a subir mais, por pressentir ausência total de relva ou arbustos para se alimentar. Percebendo que, se insistisse, apenas se cansaria mais, tentando levar o "yaqui" e também que, de nada lhe serviria mais, se ele morresse por não poder pastar, soltou o animal que prontamente tomou o caminho de casa. Quase nu, tremendo de frio, resolveu continuar para manter a circulação e esquentar seu corpo até que, aos 5700 metros de altitude, subitamente viu que havia gente morando naquelas condições extremas, uma família!
Perguntou o que faziam ali e como sobreviviam sem nada, nem animais? A resposta veio prontamente; "sobrevivemos de viajantes, peregrinos e alpinistas estrangeiros".
"Mas... como assim interpelou-os?"
"Ora, negociamos com eles e, com o que recebemos, trocamos lá embaixo pelo que necessitamos".
"Mas eu não tenho mais nada para negociar a não ser meus panos que sobraram para que não fique nu".
"Bem...quando nada mais resta para negociar por parte de um pretendente a alcançar o cume desta montanha, costumamos lhe dar a resposta oculta, que a busca pela sabedoria almeja".
"Esperem um pouco... a minha busca foi determinada pelo meu mestre lá do templo e seria meditar lá no alto para encontrar a resposta interior".
"Se queres realmente a resposta, então se despoje do último bem que tens, os seus panos que cobrem sua nudez".
"Pois então, me dispo de meu último traje, mas quero a resposta agora, disse o pretendente a discípulo".
"Seus panos de nada nos servirão para troca, mas servirão como resposta pela sua nudez e despreparo para a empreitada que julgou ser capaz de realizar, desde que iniciou sua escalada, primeiro se despindo para garantir alimento, depois perdendo sua fonte do mesmo e aqui chegando sem condições de continuar, embora, assim mesmo, por pura impaciência, tenha pretendido saber a resposta, sem passar pela experiência final determinada por seu monge mestre".
"Mas o que é isso? Me despi totalmente perante sua família e nada recebi em troca, a não ser suas palavras sem nexo, que não significam uma resposta que recompense o meu esforço?"
"Eu não tenho família nenhuma, nem casa, o que você está vendo é resultado da altitude e efeitos sobre sua mente mal oxigenada. Sou eu...o seu mestre, em imagem trocada, projetada lá do templo, de onde não sai e permaneço, mas que o esperava aqui, para testá-lo.
O teste seria para avaliar a sua capacidade de se concentrar total e exclusivamente em seu objetivo e destino, sem se deixar distrair ou levar por necessidades momentâneas e você não passou nele.
Tente de novo apenas focar no cume e no que anseia alcançar..."


("Koans" são ensinamentos orientais, de interpretação pessoal , quase sempre ocultas ou apenas decifradas pelas metáforas que contenham, para os que já estão em condições de reconhecê-las e absorvê-las em suas vidas como sabedoria aplicável. Todos os "koans" por mim postados, desde 2007, não foram transcritos de livros, mas sim, de minha autoria, portanto, com direitos de reprodução reservados).